"Eu
não sou quem você pensa. Sou orgulhosa, exibida, não sei dizer não,
detesto passar roupa, não lavo a louça no dia em que faço as unhas,
tenho preguiça de gente lenta, penso sem parar, engato um assunto no
outro, vivo com as pernas roxas, pois sou estabanada. Detesto pimentão,
abacate, arroz doce e tomate seco.
Gosto de abraçar apertado,
beijar estalado, olhar no fundo do olho até desvendar a pessoa por
inteiro. Já me enganei muito com as pessoas, já menti, já falei o que
não devia, já meti os pés pelas mãos, já fui imatura e sem noção. Já saí
na rua de cabelo sujo, unha descascada e perna cabeluda. Já tentei ser
uma super mulher e desisti dez segundos depois. Já tentei seduzir e
fazer jogo, mas não combina comigo, meus olhos sempre me entregam e eu
começo a rir quando faço tipo. Nunca usei ninguém e detesto ser usada.
Nunca traí nem fui desleal, palavra pra mim é coisa séria.
Meu lado criança acha que um dia vai mudar o mundo. Meu lado
adulto também. Não jogo lixo na rua, mas não desligo a torneira
enquanto esfrego um prato na pia. Prefiro cachorros, mas acho bonito o
jeito que os gatos se movem. Adoro animais em geral, menos insetos e
animais que são pegajosos. E não vou muito com a cara do passarinho que
começa a cantar às três da manhã.
Já plantei árvore, já escrevi
livros e quero ter um filho. Antigamente, queria dois ou três. Hoje acho
que só quero um. Já gostei de pessoas e elas já gostaram de mim. Já
iludi pessoas para deixar o meu ego de bem com a vida. Sim, eu sei que
isso é horrível, mas eu tinha vinte anos e naquela época me achava a
rainha da cocada preta. Já fui iludida por pessoas que queriam deixar
seus egos de bem com a vida. É, o mundo gira e a gente sempre leva o
troco.
Adoro chorar em filmes. E já fiquei me olhando no espelho
enquanto chorava. Treinei tanto que hoje posso afirmar que choro bonito.
Já passei trote, já apertei na campainha e saí correndo, já enchi de
desaforo pessoas que não mereciam.
Detesto perder quando estou
jogando cartas ou qualquer outro jogo. E se perco mais de uma vez
seguida sinto vontade de parar de jogar. É, eu não sei perder, confesso.
Não gosto quando alguém não gosta de mim. Não gosto quando falam mal de
mim. Não gosto quando sou criticada. Mas aprendi a lidar com isso, hoje
procuro estar com minha consciência tranquila. E entendo perfeitamente
que é impossível agradar a todos.
É claro que é bom ser amada. Quem
não gosta de um confete e serpentina? Mas prefiro sinceridade. Prefiro
que você diga que não gosta de mim do que vir aqui, sorrir um sorriso
quase sincero, virar as costas e falar mal.
Nasci pra ser livre,
mas preciso saber pra onde voltar. Gosto do meu aconchego, meu
porto-seguro, minha paz. E encontro tudo isso na minha família. Descobri
que o amor só vem quando a gente começa a curtir a própria companhia,
afinal, para se entregar para alguém é preciso saber exatamente quem
você é (e ainda assim ser feliz)." -
Clarissa Corrêa
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